Série “Um Chamado à Redescoberta” – Artigo 1

Em algum ponto do casamento , muitos casais percebem que ainda estão juntos… mas não estão mais unidos. Dividem a casa, as contas, os filhos e a agenda, mas já não compartilham verdadeiramente a vida. O brilho nos olhos se apagou, o diálogo virou lista de tarefas, o toque se tornou ausente ou automático. Estão cansados. Vivem um casamento pela metade, sem cumplicidade nenhuma por vezes.
Esse esgotamento relacional não chega de repente. Ele se instala devagar, como um vírus silencioso. Primeiro, vem a perda da admiração. Depois, a falta de escuta, o peso da rotina, a ausência de sonhos comuns, o desrespeito camuflado, a vida sexual empobrecida. E, por fim, a indiferença.
Este artigo é um convite a identificar os sinais do amor cansado, e, mais do que isso, a redescobrir o caminho de volta para um casamento inteiro, restaurado e significativo.
O Amor que se Cansa
Ao contrário do que muitos pensam, o amor não acaba — ele adoece. O cansaço no casamento é sinal de que há feridas abertas, necessidades emocionais não atendidas, e um acúmulo de frustrações que se tornaram pesadas demais para continuar carregando sozinhos.
O apóstolo Paulo, em sua famosa descrição do amor em 1 Coríntios 13:4-7, nos lembra que o amor verdadeiro “é paciente, é benigno… tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.” Mas para esse tipo de amor existir, é preciso mais do que convivência. É necessário propósito, prática e presença, aliás, muita presença.
“O amor é paciente e bondoso. O amor não arde em ciúmes, não se envaidece, não é orgulhoso, não se conduz de forma inconveniente, não busca os seus interesses, não se irrita, não se ressente do mal. O amor não se alegra com a injustiça, mas se alegra com a verdade. O amor tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta.”
1Coríntios 13:4-7 NAA
https://bible.com/bible/1840/1co.13.4-7.NAA
Sinais de que o casamento está sendo vivido pela metade
Casamentos não quebram da noite para o dia. Eles vão rachando em silêncio. Observe os seguintes sinais de que talvez vocês estejam apenas “funcionando” como casal, mas não mais se nutrindo um ao outro:
- Falta de admiração e valorização: o que antes era encantador se tornou irritante. O elogio deu lugar à crítica.
- Diálogo superficial: as conversas se limitam a logística, contas ou filhos. Não há mais partilha de sonhos, sentimentos ou fé.
- Desconexão sexual: a intimidade foi perdida ou virou obrigação. O sexo, quando existe, é automático e desprovido de vínculo emocional.
- Ausência de projetos a dois: cada um vive para si. Os planos, antes em comum, agora são separados ou inexistentes.
- Ressentimentos não resolvidos: feridas antigas voltam à tona. O silêncio se torna arma. O perdão é adiado.
Esse estado leva àquilo que chamamos em Teopsicoterapia de vida conjugal apática, onde a alma do casal adormece e os dois passam a existir, mas não mais viver juntos.
As Cinco Linguagens do Amor e o Esquecimento do Outro
Gary Chapman ensinou que cada pessoa possui uma “linguagem do amor” predominante:
- Palavras de afirmação
- Tempo de qualidade
- Toque físico
- Atos de serviço
- Presentes
Quando o amor se cansa, essas linguagens se tornam mudas ou distorcidas.
- O que antes era afirmação, vira cobrança.
- O que era tempo de qualidade, vira tempo em silêncio, olhando o celular.
- O que era toque físico, vira ausência ou apenas contato sexual vazio.
- O que era serviço por amor, vira obrigação ou disputa.
- O que era presente simbólico, vira esquecimento em datas especiais.
Um casamento começa a viver pela metade quando paramos de falar a língua do outro e passamos a esperar que ele “adivinhe” o que precisamos — enquanto nós mesmos não entregamos mais nada.
O Desejo Quebra Grades, Não Vive nelas
Esther Perel, no seu livro “Sexo no Cativeiro”, afirma que a intimidade excessiva, sem espaço de desejo, sufoca a paixão. Muitos casais confundem convivência com conexão. Passam o dia juntos, mas sem tensão criativa, sem mistério, sem admiração. E o desejo desaparece.
Ela diz: “O amor busca proximidade; o desejo precisa de espaço.”
Isso não significa distância emocional, mas sim espaço interno para continuar sendo admirado, surpreendente, desejável. Casamentos vividos pela metade têm sexo mecânico ou inexistente, porque deixaram de investir no erotismo como expressão emocional da união.
Recuperar o desejo é criar novos contextos, novas linguagens, novas formas de tocar não apenas o corpo, mas a alma do outro.
Caminhos Terapêuticos para Redescobrir o Amor
A boa notícia é que é possível voltar a viver um casamento inteiro, se os dois estiverem dispostos a recomeçar. Não se trata de voltar ao passado, mas de renascer com maturidade, consciência e fé.
Aqui vão alguns passos práticos, usados em consultório:
a) Reative o Olhar de Admiração: tire cinco minutos por dia para olhar nos olhos do seu cônjuge e dizer algo que você admira nele(a). Use palavras de afirmação com verdade.
b) Planejem um tempo de qualidade por semana: sem filhos, sem celular. Apenas os dois. Um café, um passeio, um tempo de oração juntos. O importante é se reencontrar como casal.
c) Toque com intenção: segure as mãos. Abrace com firmeza. Beije de verdade. A intimidade emocional começa com gestos simples.
d) Redefinam seus sonhos: reescrevam metas, projetos, sonhos de vida a dois. Perguntem: “O que Deus ainda quer fazer através de nós?”
e) Procurem ajuda se necessário: casais saudáveis também fazem terapia. A Teopsicoterapia pode ajudar a resgatar feridas emocionais e espirituais, reorganizar a comunicação e restaurar o sentido do casamento.
Um Chamado Espiritual à Redescoberta
Deus não nos chamou para sobreviver no casamento, mas para viver plenamente nele.
Em Apocalipse 2:4-5, o Senhor adverte a igreja de Éfeso: “Tenho, porém, contra ti que abandonaste o teu primeiro amor. Lembra-te, pois, de onde caíste, arrepende-te e volta à prática das primeiras obras.”
O mesmo princípio vale para o matrimônio: lembrar, arrepender-se e voltar a praticar.
Lembrar do primeiro amor, dos votos, dos gestos espontâneos. Arrepender-se pelas omissões e falhas. E voltar a agir com intencionalidade e graça.
Um Recomeço é Possível
Se você sente que está vivendo um casamento pela metade, saiba: você não está sozinho. Muitos casais passam por essa fase, mas apenas os que respondem ao chamado de Deus para reconstruir conseguem experimentar o novo.
Não se trata de voltar a ser o que eram, mas de descobrir quem ainda podem ser juntos. O amor que parece cansado pode ser restaurado. A conexão que se perdeu pode ser reencontrada. A chama apagada pode ser reacendida com fé, decisão e trabalho mútuo.
O casamento é um chamado divino, e Deus ainda acredita em vocês.
Artigo publicado na Revista Guia-me, pelo nosso colunista Dr Valcelí Leite
Publicado neste blog com a autorização do autor, leia outros artigos desse autor : Lições para uma Vida Melhor
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Valcelí Leite (@ValceliLeite) é pastor, teoterapeuta, presidente da ABRATHEO (Associação Brasileira de Teopsicoterapia), com formação em Fisioterapia e pós-graduações em Terapia Familiar Sistêmica, Cognitive Behavioral Therapy – TCC, e MBA em Teoterapia e Competência Emocional. Atua como teopsicoterapeuta com orientação a casais e famílias. Palestrante sobre temas como Educação de Filhos, Internet e Vida Conjugal, Ciência do Bem-estar e Como Evitar a Ansiedade. Ex-superintendente em instituição filantrópica, com gestão em treinamento de liderança, formação de equipes e palestras motivacionais em quatro estados brasileiros e mais de 30 cidades. Apresentou programas de rádio e TV em São Paulo, Brasília e Salvador.